A sonata a Kreutzer, de Lev Tolstói

 


"-Pensei muito, muita coisa eu encaro atualmente de outra maneira, e dá vontade de dizer tudo isso. Pois bem, começamos a nossa vida na cidade. Ali, a vida é melhor para as pessoas infelizes. Na cidade, um homem pode viver cem anos e nem perceber que já morreu e apodreceu há muito. Não há tempo para examinar a si mesmo, está tudo ocupado." 


Todas as obras de Tolstoi lidas por mim até o momento, foram suficientes para mostrar a diferença entre ele e o seu conterrâneo Dostoiévski, que não eram tão amigos. Este apresenta a característica de ser mais sentimental e apesar de também ter forte carga psicológica de seus personagens, percebemos que Dostoiévski é um autor que acreditava no amor, principalmente em suas obras escritas antes de ele ser preso. Entretanto, isso não é algo que encontramos em Tolstoi, visto que são visíveis a sua descrença quanto a pureza do ser humano e em suas obras são retratadas constantemente a questão do abandono, adultério e ciúmes.

Neste livro não foi o contrário. Aqui acompanhamos uma história muito simples,porém construída com riqueza de reflexões a respeito de uma  instituição social ainda muito sonhada por muitos: o casamento.

Conheceremos dois estranhos os quais se conhecem em um trem. Um velho tagarela passa a falar diversos assuntos desconexos dos quais aproximará ao estilo de um monólogo interior. Dessa maneira, conforme a história se passa, vemos que este personagem teve uma juventude regada a bebidas, mulheres dentre outras extravagâncias. Entretanto, inevitávelmente encontra uma moça da qual ele se apaixona, casa-se e constroi uma vida juntos.

Tudo lindo,perfeito e previsível, certo?

Não!

A partir desse momento iniciam-se considerações do personagem que resumem-se a uma visão extremamente pessimista quando ao amor, ao casamento em si e sociedade em geral. 

Sinceramente, essa leitura me agradou bastante, mas bastante mesmo. Mas tem um porém... eu gostei muito desse livro porque, de certa maneira, sou uma pessoa pessimista quanto a praticamente tudo, inclusive ao casamento, que cada vez mais acho algo mais próximo de um contrato ou mais feito por conta da festa a qual faz todos sentirem-se em um conto de fadas, do que de uma prova de amor em si. Até porque, o casamento é o que vem depois das festanças, com  a convivência e infortúnios de cada dia. Assim, foi muito fácil ler algumas passagens e tudo o mais. Todavia, para uma pessoa que tem uma visão romantizada dos relacionamentos, o sonho de casar, formar uma família e até mesmo de achar essa a solução para seus problemas, apesar dos entretantos, talvez essa leitura possa lhe incomodar bastante.

Ademais, as questões a respeito de estereótipos sociais e a vida na grande cidade como, por exemplo, a maneira como somos condicionados a vivermos de determinada forma e o modo que isso pode afetar o humor e fator humano a algo tão pequeno e insignificante, nos tirando de nossa própria personalidade até não sabermos mais quem somos. 

Em resumo, é um livro realista, daqueles que tiram você de sua zona de conforto e faz você pensar sobre até que ponto o amor não tornou-se uma mercadoria ao momento que passa a ser inserido aos moldes sociais para satisfazer o que já estava imposto antes mesmo de nascermos. E não estou dizendo que não acredito no amor, apenas que ele está sendo confundido com outras situações para gerar manipulação social. 

Além disso, o título desse livro é inspirado em uma sonata de Beethoven que chama-se "Kreutzer". Para escutar clique neste link: https://www.youtube.com/watch?v=5YKmb7_y3E8&t=60s .

É bem bonita e também uma opção para escutar enquanto lê o livro, pois fica toda aquela sintonia.

Eu achei incrível, fantástico e sensacional. Quase uma leitura obrigatória, um tiro a ingenuidade e aos conceitos do que é certo e errado. Todos nós que já amamos um dia, sabemos que nunca é tão fácil assim.  

Cuidado, mas cuidado mesmo com as entrelinhas. Até a próxima resenha.

Comentários

Postagens mais visitadas