Madame Bovary, de Gustave Flaubert



“No fundo de sua alma, todavia, esperava um acontecimento.”

Livro o qual gerou repercussão acalorada à época, de maneira a proporcionar ao autor um processo no Ministério Público por: “ofensa à moral, à religião e aos bons costumes”. Apesar de parecer exagero, é necessário analisar o contexto histórico, sociológico e cultural em que o livro foi escrito, caracterizado pelo extremo conservadorismo e misoginia,(isso não demonstra uma evolução significativa de nossa sociedade atual, mas era pior).

Apesar do título, a narrativa trata de diversos personagens e seus conflitos psicológicos e cotidianos. Charles Bovary, a princípio, é um homem recluso e tímido, o primeiro capítulo é dedicado apenas à descrição de sua trajetória desde uma adolescencia frustrada, aos estudos em medicina, a um casamento estranho e ao exercer sua profissão. 

Ao longo da narrativa, ele conhece uma mulher atraente, de beleza encantadora, sedutora, inteligente e que ainda mora com o pai. Ela é Emma Bovary e a história, a partir de então, será focada na decadência gradual de si mesma e dos sonhos, até mesmo infantis, dissolvidos conforme o casamento com Charles prossegue. 

Ao longo dos anos, o livro Madame Bovary foi perdendo seu significado visto que é, muitas vezes, apenas resumido às traições de Emma e à sua morte trágica. No entanto, esse livro ao ser lido com cuidado e atenção, pode-se perceber diversos outros temas abordados mesmo nas entrelinhas. Uma das discussões válidas é a questão da maneira como Emma é uma leitora assídua de romances românticos e o quanto isso deturpa sua visão do amor, buscando incessantemente uma perfeição da qual não existe. Pode parecer algo distante da realidade, mas em nossa sociedade as mulheres/meninas são desde crianças inseridas na literatura a partir de contos de fadas, príncipes e princesas com finais espetaculares, coloridos e perfeitos. Porém, inconscientemente a visão feminina deste príncipe permanece até a vida adulta, causando imensa frustração quando encontramos não príncipes, mas seres humanos.

Em contrapartida, o seu marido, Charles, não ajuda. Um homem extremamente ausente, relapso, nunca diz que a ama e não apresenta, segundo as descrições, sentimentos profundos e nem mesmo carnais por Emma. Isso a faz sentir um amor solitário e entediante, buscando em seus amantes essa falta, mesmo que isso também a faça se nublar cada vez mais. 

Como dito anteriormente, o livro levou o autor ao tribunal em decorrência dos assuntos tratados, no entanto, ainda é um enredo comentado e também polêmico até os dias atuais. A escrita é bastante descritiva, personagens dos quais apresentam caráter completamente questionável, contraditórios, estranhos, depressivos e confusos; não é uma leitura confortável, a cena final é demasiada detalhada e passei um pouco mal lendo, enjoos e mal estar em geral - apenas senti isso com Crime e Castigo e O Jovem Törless- em suma, um livro incrível e pessimista, do jeito que eu gosto. 

Recomendadíssimo!


Cuidado com as entrelinhas e até a próxima!


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