Perto do Coração Selvagem, de Clarice Lispector

 


“O que é que se consegue quando se fica feliz? (...) Queria saber: depois que se é feliz o que acontece? O que vem depois?”

“Lembrava-se das antigas colegas – daquelas meninas sempre vivas, sabendo tudo, tendo ligação com cinemas, livros, namoros, roupas, daqueles moças de quem nunca pudera aproximar-se de verdade, calada como era, sem propriamente o que dizer.”

“Liberdade é pouco, o que desejo ainda não tem nome.”

 

Publicado em 1943, quando a autora tinha vinte e três anos de idade, tornou-se um de seus livros mais icônicos surpreendendo não apenas pela escrita intimista, mas pela idade de Clarice ao escrever tais pensamentos, isto é, uma jovem de alma velha. O título advém de uma frase de Retrato de um artista quando jovem, de James Joyce, citada logo ao início do livro: “Ele estava só. Estava abandonado, feliz, perto do coração selvagem” e apesar de tamanha genialidade, a história não foi bem recebida por todos os críticos à época.

A narrativa terá como principal característica a formação de Joana, que na primeira parte do romance conheceremos um pouco de sua infância intercalado com o presente. Percebe-se então que em sua juventude a menina era introvertida e marcada por diversos questionamentos filosóficos e metafísicos, junto a descoberta de seu próprio corpo passando pela puberdade. Entretanto, a segunda parte terá Joana adulta, casada e também demonstrando muitos questionamentos a respeito de sua relação com Otávio, seu marido.

Em razão de suas veementes críticas instituição matrimonial, o livro foi uma revolução no momento histórico o qual foi publicado, quando não havia a opção a mulher de não casar. Os diálogos internos que Joana faz a respeito de sua condição como esposa valem muito a pena serem lidos e visitados. Além disso, a própria figura da personagem Joana em si é excepcional, pois percebe-se através de seus questionamentos o sentimento, mesmo que desconhecido por ora, de não pertencimento tanto quando era uma menina/moça até o momento presente, adulta e casada. A partir de tal ideia, temos que a personagem busca, busca, busca e busca um pouco mais, desesperadamente o seu lugar no mundo.

Perto do coração selvagem retirou o posto de primeiro lugar de A Hora da Estrela e tornou-se o meu favorito da autora, visto que era talvez tudo o que eu precisasse ler neste momento e porque me identifiquei bastante com Joana. Mais do que gostaria, na realidade.

Mais do que recomendado, maravilhoso.

Cuidado com as entrelinhas e até a próxima resenha.

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